Estou escrevendo um livro (sim, eu sei, faz tempo, mas está avançando…). Eis que hoje saiu uma notícia cuja resposta estava PRONTA em um capítulo já escrito do livro. E eis que as pessoas estão me pedindo um posicionamento sobre esse assunto. Não me resta opção senão plagiar a mim mesmo.
A notícia em questão é a publicação de uma revisão sistemática e metanálise da Cochrane sobre low-carb versus dietas “balanceadas em carboidratos” (eu tenho nojo dessa expressão, clique aqui para saber mais…) que sugere que, no fim das contas, é tudo igual (significando que low-carb é apenas um pouco melhor, uma vantagem de 1kg, que não é clinicamente significativa).
Tenha em mente que o que você vai ler a seguir é um trecho de um capítulo de um livro que ainda não foi publicado, mas que foi escrito ANTES da divulgação desta metanálise. Não é, portanto, uma reação defensiva a essa revisão sistemática em si, e sim uma crítica que tenho às metanálises sobre dieta e estilo de vida em geral.
Finalmente – o que “carros” têm a ver com isso? Leia o texto e você entenderá
Como vimos, um grande corpo de estudos surgiu nos últimos 20 anos. Aquilo que um dia foi a dieta de livros populares de emagrecimento, passou a frequentar as páginas dos periódicos revisados pelos pares. Um das formas de resumir uma grande quantidade de estudos sobre um mesmo assunto são as revisões sistemáticas, nas quais os autores definem previamente os critérios de inclusão e de exclusão dos estudos e fazem uma busca de toda a literatura, e as metanálises, em que se aplicam métodos matemáticos para tentar fazer um sumário dos resultados ponderados de todos os estudos que preenchem os critérios. Várias metanálises sugerem uma ligeira superioridade das dietas de baixo carboidrato na redução de peso quando comparadas a outras estratégias, especialmente às dietas de baixa gordura (low-fat), mas quase sempre tal superioridade vai diminuindo com o tempo, até desaparecer em torno de 12 meses. O que explica isso?
Primeiramente, a definição de low-carb. Diversos estudos definem como low-carb uma dieta em que no máximo 40% das calorias são oriundas de carboidratos. Uma low-carb moderada como essa, na qual evita-se açúcar e farináceos, mas que permite o consumo liberal de tubérculos (como batata, batata doce, mandioca) e frutas doces pode ser adequada para pessoas saudáveis e que estão próximas ao seu peso adequado, mas são simplesmente pouco eficazes como estratégias terapêuticas para o tratamento do sobrepeso ou de condições como síndrome metabólica e diabetes (ver capítulo 10). Assim como a dose de um medicamento precisa ser alinhada à gravidade da situação, uma dieta para reversão de condições ou doenças precisa ser mais restritiva do que quando o objetivo é meramente a manutenção da saúde. Misturar, em uma mesma revisão, estudos que usam dietas com menos de 40 ou menos de 20 gramas de carboidratos por dia com outras que aceitam até 40% das calorias na forma de carboidratos (o que equivale a 200 gramas de carboidratos em uma dieta de 2000 calorias) é uma forma de diluir o efeito nos resultados.
Em segundo lugar, vem a questão das dietas isocalóricas. O estudo DIRECT, mencionado acima, é um teste de algo mais parecido com o mundo real: low-carb sem restrição calórica voluntária e demais dietas com restrição calórica imposta. Segundo a tabela 2 do estudo, todos os grupos tiveram uma redução semelhante em seu consumo calórico – a diferença tendo sido o motivo: em low-carb, as pessoas comiam menos por maior saciedade, e nas outras dietas elas comiam menos por decreto. Mas, e se eu desenhar um estudo no qual as calorias são exatamente iguais nos dois grupos? Vários estudos assim foram feitos, e os resultados são precisamente os que você imagina: ambos grupos perdem a mesma quantidade de peso. A inclusão deste tipo de estudo – chamado de isocalórico – nas revisões e metanálises é outra forma de diluir a eficácia da estratégia low-carb, fazendo com que todas as dietas tenham resultados semelhantes.
Na verdade, o que houve foi uma sutil evolução da narrativa sobre a estratégia low-carb por parte da ortodoxia nutricional. Primeiramente, afirmava-se que se tratava de simples picaretagem. Era “aquela dieta da proteína, aquela do Dr. Atkins”. Tal argumentação não se sustentava mais após a sequência de ensaios clínicos publicados em periódicos de alto impacto nos anos 2000. Então, aos poucos, a mensagem mudou e passou a ser “low-carb não é TÃO BOA assim”. Afinal, em estudos nos quais as calorias eram artificialmente mantidas fixas os resultados eram iguais (nada mais óbvio). Mas – perceba – tal afirmação contém em si mesma a admissão tácita de que low-carb funciona. Ou seja, não é mais “picaretagem”, ilusão, modinha. É “apenas” algo que não seria melhor do que as estratégias tradicionais. Será?
É interessante, na mesma linha de raciocínio, ver pessoas que, quando confrontadas com tais fatos, rebatem com “sim, mas low-carb emagrece “apenas” porque se come menos”? É mesmo Einstein? Se não fosse assim seria como então – lipoaspiração? Aqui, vemos mais uma vez a evolução da narrativa ortodoxa. De “não funciona” para “não funciona melhor que as demais”; e de “não funciona melhor que as demais” para “só funciona melhor que as demais porque as pessoas comem menos”. Mas isso não é uma coisa boa? Bilhões de dólares são gastos em pesquisas para identificar drogas que reduzam o apetite. Se uma dieta é boa “apenas” porque reduz o apetite, isso não é maravilhoso? Ao invés de usar medicamentos, com seus potenciais efeitos colaterais e custos, poder comer comida de verdade, adquirida na feira, na peixaria e no açougue, e sentir menos fome no processo?
Mas voltando aos tais estudos isocalóricos. Imagine que eu propusesse uma corrida entre um Fusca e uma Ferrari. Seria um teste desnecessário, já sabemos quem chegará na frente. Mas… e se eu colocasse uma regra: a velocidade máxima permitida é 20 Km/h. Neste caso, é provável que ambos atingissem juntos a linha de chegada. E o que isso prova? Que Ferrari e Fusca são iguais? Vou propor aqui um outro experimento. Sabemos que uma das drogas mais eficientes para o emagrecimento é a semaglutida. Um estudo recente, publicado no NEJM (Once-Weekly Semaglutide in Adults with Overweight or Obesity | NEJM) mostrou que a droga produz uma perda média de 12,8% do peso corporal, quando comparado com placebo (que produziu apenas 2,8% de perda de peso). Que tal se fizéssemos os seguinte: semaglutida versus placebo, mas com uma regra: todos teriam que comer exatamente 1.500 calorias por dia. Ao final do estudo, a perda de peso média seria exatamente a mesma nos dois grupos. Seria justo concluir que a semaglutida e o placebo são iguais? Ou ainda: “semaglutida funciona, mas apenas porque quem usa come menos”. Mas comer menos não é justamente a característica definidora do sucesso dessa droga? Se você impede um grupo de comer menos do que o outro, você anula completamente a possibilidade de avaliar qualquer coisa. É, pois é. O mesmo acontece nos estudos isocalóricos de dietas no qual o desfecho é emagrecimento.
Recapitulando, já vimos que o efeito de low-carb para emagrecimento parece menor nas metanálises do que em estudos como o DIRECT por 1) inclusão de estudos em que a restrição de carboidratos é insuficiente e 2) inclusão de estudos isocalóricos. Mas há um terceiro motivo pelo qual os efeitos de low-carb (e de todas as dietas) nas metanálises tende à nulidade: a questão do “compliance”, termo em inglês que significa conformidade ou observância das orientações. Vamos traduzi-lo aqui por adesão.
O melhor plano do mundo não funcionará se você não segui-lo, diz o ditado. Quando falamos sobre “o melhor plano”, estamos nos referindo à sua eficácia. A eficácia é uma propriedade intrínseca de uma conduta. Por exemplo: se um indivíduo treinar 3 vezes por semana o bíceps do braço com cargas crescentes, haverá um aumento mensurável da massa muscular – trata-se de intervenção altamente eficaz. O treino de força funciona – o resultado é um desfecho praticamente garantido. Se for posto em prática, é claro. Mas imagine o seguinte. Você recebe instruções para fazer este tipo de treino, mas começa a faltar às sessões por diversos motivos. Também acontece de chegar atrasado e fazer apenas um terço do treino. Por fim, no último mês, você desiste completamente. E, ao final de 90 dias, o resultado é que não houve hipertrofia mensurável. Seu bíceps está igual ao que era antes. Você diria que o treino de força é ineficaz para a hipertrofia? É claro que não – o plano só funcionará se você segui-lo corretamente. A eficácia, repito, é uma característica intrínseca da conduta (no caso, do treino de força).
No mundo real, as pessoas não seguem, ao menos como grupo, como média, os planos ao pé da letra. É normal que as pessoas desistam daquilo que requer esforço, que causa desconforto. Isso sem falar de situações que são imprevisíveis: mudança ou perda de emprego, problemas familiares, divórcios, nascimento de filhos, morte de pessoas próximas. A vida pode sabotar nossas melhores intenções. Existe um termo que leva em conta todas essas possibilidades – chama-se de efetividade. Quando falamos de eficácia, falamos sobre a capacidade inerente de um método produzir resultados caso seja utilizado da forma correta pelo tempo necessário; quando falamos de efetividade, avaliamos como a recomendação de seguir um método (tomar um remédio, fazer exercício, seguir uma dieta) afeta os resultados, no mundo real. A efetividade será sempre pior do que a eficácia.
O que é mais importante, a eficácia ou a efetividade? A pergunta pode parecer simples, mas a resposta é desafiadora. Quando se trata de intervenções de saúde pública ou para a orientação de um grande número de pessoas, a efetividade tende a ser mais relevante. De que adianta uma estratégia muito eficaz mas que as pessoas não colocam, de fato, em prática? Por este motivo, os estudos randomizados de medicamentos, por exemplo, analisam os resultados de acordo com o grupo para o qual a pessoa foi sorteada, independentemente de a pessoa tomar ou não o remédio. Sim, você leu corretamente. Em um estudo no qual 500 pessoas foram alocadas para usar uma medicação e 500 foram alocadas para placebo, mesmo que algumas desistam de usar o medicamento ou que o usem de forma irregular (pois esquecem de tomar os comprimidos, por exemplo), essa pessoas seguem sendo contabilizadas no resultado de acordo com o grupo para o qual foram originalmente designadas. A isso se chama análise por intenção de tratar (ITT, na sigla em inglês). Por que fazemos assim? Que sentido faz contabilizar como tratado quem não está seguindo o tratamento? Há outros motivos que fogem do escopo deste capítulo, mas por ora quero enfatizar que tais estudos estão avaliando a efetividade do tratamento, ou seja, o que aconteceria no mundo real. E, no mundo real, pessoas esquecem de usar seus comprimidos, ou desistem.
A questão da adesão ao tratamento é ainda mais complicada quando se trata de intervenções de estilo de vida. É evidente que é mais fácil convencer pessoas a tomar uma pílula diariamente do que a fazer exercícios regulares por 3 anos, por exemplo. Mas, assim como nos estudos sobre medicamentos, também os estudos de intervenções de estilo de vida são analisados pelo método ITT (intenção de tratar). Isso significa que, quando você lê um estudo científico como o DIRECT trial, sobre o qual falamos acima, com duração de 2 anos, você não está, de fato, comparando pessoas que fizeram uma dieta Atkins, mediterrânea ou low-fat por 24 meses. Você está comparando pessoas que foram orientadas a seguir tais dietas. Ora, quanto mais longo for um estudo, menor será a adesão. É da natureza humana. Assim, podemos imaginar um estudo hipotético no qual as pessoas começam com boa adesão, mas ao final do qual nenhum dos participantes está mais seguindo coisa alguma. O que você concluiria? Pela análise do tipo ITT, a conclusão é que o tratamento não funciona. Na verdade, o estudo mostrou que não há efetividade, mas isso não significa que o tratamento não seja eficaz. Eficácia, como já dissemos acima, é uma característica intrínseca do tratamento: um tratamento eficaz, se for posto em prática, funcionará para a maioria das pessoas. O tratamento mais eficaz, se não for bem feito, não funcionará, por óbvio.
Quando se trata de estudos de dieta (ou, na verdade, de qualquer intervenção de estilo de vida), a efetividade tende a zero quanto maior for a duração do estudo. Alguns estudos são exceções: a eficácia observada no início é razoavelmente mantida com o passar do tempo. Tais estudos, em geral, empregam uma série de ferramentas para garantir maior adesão: reuniões semanais com nutricionista, sessões periódicas de orientação em grupo, etc. Tudo isso custa dinheiro, de modo que a maioria dos ensaios clínicos não têm verba para manter um nível tão alto de supervisão. Assim, quando você lê em uma metanálise que a estratégia low-carb tem um efeito superior modesto em 6 meses quando comparada a outras dietas, e que tal efeito tende a desaparecer após 12 meses de seguimento, é preciso ter em conta que os estudos são heterogêneos, que a adesão a qualquer dieta reduz-se com o tempo, e que qualquer estudo de estilo de vida que tiver uma duração mais longa terá resultados que tendem à nulidade, mesmo que a intervenção seja altamente eficaz.
O que nos traz novamente à pergunta: o que é mais importante, eficácia ou efetividade. Para você, que busca um tratamento, uma solução, uma intervenção que funcione, especialmente se estivermos falando que uma estratégia de estilo de vida, penso que a eficácia é mais importante. Vejamos alguns exemplos:
Sabemos que a adesão a um programa regular de exercícios físicos é baixa. Aliás, este é um conhecido modelo de negócio de certas academias de ginástica. Oferecem-se grandes descontos para planos de maior duração, como o plano anual, porque é um fato da vida que, ao final de vários meses, boa parte das pessoas terá desistido. De fato, vários destes estabelecimentos vivem mais de pessoas que pagam e não frequentam do que de seus frequentadores assíduos. Suponhamos que você queira ganhar massa muscular, e marque uma entrevista com um educador físico para lhe ajudar a atingir tal meta. O profissional deverá utilizar dados de eficácia ou de efetividade? Imagine a seguinte conversa:
– “Treino de força com aumento gradual da carga e do volume de treino são altamente eficazes para o ganho de massa muscular, mas sugiro que você nem comece”.
– “Mas, como assim? Eu vim aqui para que você me ajude a atingir um objetivo, e você está me desestimulando!”
– “Acontece que a maioria das pessoas que inicia este plano desiste, de modo que, ao final de um ano, o resultados dos que são randomizados para treino de força versus o grupo controle é o mesmo. Logo, exercício e sofá são a mesma coisa, em termos de efetividade, após um ano”.
É evidente que essa conversa jamais ocorreria – e nem deveria ocorrer. Quem busca a opinião de um profissional está buscando saber qual a estratégia mais eficaz, ou seja, aquela que, se executada, trará os melhores resultados. O fato de se saber que muitas pessoas desistirão da prática regular de exercícios nunca foi motivo para que se deixasse de estimular a sua prática. Justamente por sabermos que não é fácil, fazemos de tudo, seja como profissional da área, seja como sociedade, para estimular e facilitar.
Outra situação análoga é o tabagismo. A nicotina é, reconhecidamente, uma das substâncias mais viciantes que existe, e o tabagismo está associado a um sem número de males à saúde. Induzir à cessação do tabagismo é uma das intervenções mais eficazes para a prevenção de doenças que podemos fazer como profissionais de saúde – literalmente salva vidas. A efetividade, porém, é muito, muito baixa. Uma revisão sistemática e metanálise da Cochrane (organização reconhecida por revisões de alta qualidade) (Physician advice for smoking cessation – Stead, LF – 2013 | Cochrane Library) indica que 2 a 3% das pessoas deixam espontaneamente de fumar e permanecem não-fumantes por 12 meses. Se um médico orientar ao paciente que deixe de fumar, isso pode aumentar tais chances de 1 a 3%. Ou seja, embora deixar de fumar seja comprovadamente bom para a saúde, cerca de 95% dos pacientes orientados a cessar o tabagismo estarão fumando em 1 ano. Se fôssemos nos basear unicamente em efetividade, não perderíamos tempo orientando algo que quase ninguém vai seguir. Mas alguém realmente acha que isso seria algo razoável? É claro que não. Todas as diretrizes indicam, corretamente, que o médico deve incluir em sua consulta o conselho de cessação do tabagismo, pois, embora a efetividade de tal intervenção seja baixa, a eficácia na prevenção de doenças, para quem segue, é gigantesca.
Volte por um momento à figura da página XXXXX:

O que você vê? Logo no início, as curvas divergem e, nos primeiros meses, low-carb é muito superior para perda de peso. Algumas pessoas dirão “mas no início de uma low-carb, as pessoas perdem água”. Falaremos mais sobre isso no capítulo XXXX, mas, porquanto seja verdade que há uma redução de glicogênio e água no início de uma dieta low-carb, estamos falando da ordem de 0,5 a 1,5 Kg de água, e tal perda ocorre nos primeiros dias. Uma perda de 7 Kg que se mantém por meses após o início do estudo não é, por óbvio, água. Voltando à figura: com o passar dos meses, as curvas tendem a convergir. E isso que o DIRECT é um estudo que forneceu grande suporte nos dois anos de sua duração, com reuniões periódicas e o almoço integralmente fornecido pela pesquisa em um refeitório que fabricava as refeições de acordo com a dieta para a qual a pessoa havia sido randomizada. A pergunta que faço aqui é a seguinte: qual o melhor momento para medir a EFICÁCIA das diferentes dietas? Nos primeiros 3 a 6 meses, ou ao final dos 24 meses? A resposta é nos primeiros 3 a 6 meses. E o motivo é óbvio: é no início de um estudo que as pessoas estão ainda motivadas: estão, de fato, seguindo as orientações. Não é raro ler críticas de estudos de intervenções dietéticas mais curtas; tais críticas salientam que, ao final de 12 ou 24 meses, as dietas são todas iguais. Sinceramente, às vezes me pergunto se isso é malícia ou ignorância. Todas as intervenções de estilo de vida – TODAS – perdem efetividade com o tempo e, se o estudo for suficientemente longo, acabarão sem diferença estatisticamente significativa em relação ao grupo controle. Perdoe-me ser repetitivo, mas o exercício físico não perde a eficácia com o tempo, as pessoas (enquanto grupo, na média) é que deixam de praticar exercício. Mas o exercício é eficaz para o que se propõe, e por isso orientamos o indivíduo a praticá-lo mesmo assim. Uma estratégia low-carb não deixa de funcionar após 6 meses, as pessoas é que deixam de seguir a estratégia (enquanto grupo, na média). A pessoa que procura um profissional não veio para ouvir o quão provável é o seu fracasso daqui a 2 anos. A pessoa quer saber o que funciona melhor. Qual a estratégia que, se executada, produz os melhores resultados; em outras palavras, ela quer saber o que é mais eficaz.
Há uma empresa que se dedica ao tratamento de diabetes tipo 2 com low-carb chamada Virta Health (falaremos mais sobre isso no capítulo XXXX). O estudo do Virta não é randomizado, o que significa que são pessoas que optaram por tal forma de tratamento – o que aumenta a adesão. Além disso, o programa da Virta emprega ferramentas como aplicativo com contato diário com coach de saúde, balanças sem fio, monitoramento remoto de glicose e corpos cetônicos. É, sem dúvida, uma intervenção muito mais intensiva do que o simples “conselho” de cortar carboidratos. Observe o gráfico a seguir:

Neste gráfico, é possível observar que há perda de efetividade de todas as estratégias com o tempo. A linha vermelha representa um estudo de low-carb sem restrição calórica, a linha verde é um estudo de restrição calórica extrema, com shakes de 800 calorias por dia (este estudo também chama-se DIRECT, não confundir com o DIRECT de 2008 sobre o qual falamos antes); a linha púrpura representa outro estudo com restrição calórica severa (“very low-calorie diet”) e, por fim, a linha azul são os resultados de 2 anos do Virta – uma dieta very low-carb sem restrição calórica voluntária, mas com suporte remoto contínuo. Observe-se que, com low-carb sem restrição calórica voluntária, ou seja, sem passar fome, é possível manter uma perda de peso superior a 10% da massa corporal por um período de 2 anos. Low-carb não deixa de funcionar com o tempo, se as pessoas continuarem adotando o estilo de vida. A questão não é eficácia – a eficácia de low-carb para perda de peso é ponto pacífico na literatura científica. A questão para toda e qualquer estratégia que envolva mudanças de estilo de vida é maximizar a efetividade através da adesão continuada.
Assim, já havíamos visto que o efeito de low-carb para emagrecimento parece menor nas metanálises do que o que vemos nos estudos mais bem conduzidos e na prática clínica devido à inclusão de trabalhos em que a restrição de carboidratos é insuficiente, e por inclusão de estudos isocalóricos. O principal motivo, porém, é a adesão inadequada – o baixo “compliance” – com o passar do tempo. A insistência de se levar mais em conta apenas os estudos de longa duração em detrimento de estudos mais bem controlados (que, necessariamente, são mais curtos) produz, paradoxalmente, uma distorção que obscurece a real eficácia da estratégia. Como já dissemos acima, a verdade é que TODAS as intervenções de estilo de vida tendem à efetividade nula no longo prazo, quando se considera a média de grupos de pessoas. Afinal, os estudos descrevem os resultados de grupos designados para determinada dieta, independentemente de estarem seguindo a dieta ou não. Se fôssemos nos basear nisso, não recomendaríamos que ninguém se exercitasse ou parasse de fumar.