A Dra Maíra Soliani acaba de publicar seu livro A Ciência do Desconforto, que se encontra em pré-venda:
Conheço a Dra Maíra há muitos anos, e acompanhei o aprofundamento dos seus estudos sobre jejum intermitente, que incluíram uma temporada em Toronto, no Canadá, acompanhando do Dr Jason Fung, talvez a maior autoridade em jejum terapêutico na atualidade. O livro, não por acaso, conta com um prefácio do Dr. Fung.
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Mas este não é um livro sobre jejum – embora o jejum intermitente faça parte das recomendações. Trata-se de um manual prático – e cientificamente embasado – para melhorar a saúde física e mental. É, antes de mais nada, uma obra voltada aos aspectos comportamentais necessários à melhora da saúde. De forma muito honesta o livro explica, desde o título, que isso não pode ser obtido sem algum grau de desconforto. Mas não se assuste: são doses toleráveis e progressivas desse remédio.
Hormese
Hormese é um conceito que muito me agrada, e que é bastante explorado pela Dra Maíra. Nas palavras da autora: “Hormese é um termo utilizado para descrever um fenômeno no qual pequenas doses de um estresse ou agente prejudicial podem, na verdade, produzir efeitos benéficos no organismo, tornando-o mais forte e resiliente. É como um treino para o corpo: quando exposto a desafios moderados e intermitentes, ele se adapta e melhora sua capacidade de resposta. Exemplos clássicos incluem o jejum, o exercício físico e a exposição ao frio ou ao calor”. Como todos estes estímulos que representam estresse ou pequenos danos são desconfortáveis, resulta que algum grau de desconforto é necessário para a saúde. O motivo pelo qual estas coisas nos causam desconforto é para que, durante a evolução da espécie, evitássemos lesões causadas pelo seu excesso. Nada preparou o nosso corpo para um mundo em que fosse possível evitar todos os desconfortos – que é a grande armadilha que construímos para nós mesmos.
O livro
Nos primeiros capítulos, o livro situa o leitor quanto ao tamanho do problema que enfrentamos e como a disfunção metabólica se tornou uma epidemia silenciosa na sociedade moderna. A introdução (O Elefante na Sala) apresenta a questão central: enquanto muitos focam na obesidade como problema principal, a verdadeira raiz da crise de saúde está na hiperinsulinemia e no metabolismo desregulado, fatores que muitas vezes se manifestam antes mesmo do ganho de peso significativo. Maíra aprofunda essa análise, trazendo dados alarmantes sobre obesidade, diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares e esteatose hepática, mostrando como essas condições estão interligadas. Ela utiliza a analogia do abraço da jiboia para ilustrar como o “metabolismo quebrado” se instala lentamente, sem que a pessoa perceba, até que as consequências se tornem inevitáveis. Esse início prepara o leitor para compreender que a raiz do problema não é apenas o que comemos ou quanto pesamos, mas como os hábitos modernos – o conforto! – minam nossa saúde de forma gradual e quase imperceptível, tal qual a jiboia.
Em A Lógica do “Eu Mereço” Maíra mostra como a busca constante por recompensas imediatas – comida ultraprocessada, sedentarismo, distrações digitais – nos prende em um ciclo de fragilidade metabólica. A autora explica como pequenos hábitos diários, justificados pelo “eu mereço”, se acumulam silenciosamente, prejudicando a saúde a longo prazo. Ela também alerta para o exagero nos fins de semana e férias. O capítulo provoca uma reflexão: em vez de “eu mereço” me recompensar com excessos, deveríamos pensar “eu mereço uma saúde melhor”.
Em A Crise do Conforto, a autora argumenta que o excesso de comodidade na vida moderna nos tornou metabolicamente frágeis. Gostei muito da metáfora que a Dra Maíra usou para isso – o cacto. Ele é adaptado para sobreviver com pouquíssima água. Embora plantas “gostem” de água, água à vontade faz mal ao cacto. “Hoje, nós somos como cactos plantados em uma floresta tropical”, escreve. Vivemos com excesso de água, mas não deixamos de ser cactos. Conforto em excesso pode ser fatal.
Em A Diferença entre o Remédio e o Veneno é a Dose, a autora explora como certos estímulos podem ser benéficos ou prejudiciais, dependendo da intensidade e frequência com que ocorrem. Inspirada no princípio da hormese, ela argumenta que pequenos desafios — como jejum, exercícios e exposição ao frio — fortalecem o metabolismo e a resiliência do corpo, enquanto o excesso de conforto e indulgência gera fragilidade. Não é o estímulo em si que define se algo faz bem ou mal, mas sim a dose. Comer pode ser nutritivo ou destrutivo, exercício pode ser fortalecedor ou desgastante, e até o estresse, em pequenas quantidades, pode ser um gatilho para crescimento. Isso ajuda o leitor a encarar o desconforto como um aliado da saúde, desde que seja aplicado na medida certa.
O restante do livro aprofunda a aplicação prática desses conceitos, mostrando como pequenas doses de desconforto intencional podem restaurar a saúde metabólica e melhorar a qualidade de vida. Cada capítulo aborda um pilar essencial para essa transformação: alimentação , jejum estratégico, sono de qualidade, movimento regular e a importância de desacelerar (incluindo o desconectar-se, algo muito difícil para mim, admito). No que tange à alimentação, o foco é em comida de verdade, evitando ultraprocessados e respeitando os sinais de fome e saciedade.
Ao longo do livro, ela reforça que não se trata de buscar sofrimento, mas sim de evitar os perigos do excesso de conforto. Assino embaixo.
Encerrando
Este é um livro necessário. Cada um de nós encontrará algumas áreas em que estamos confortáveis demais. Eu encontrei mais de uma! Maíra conseguiu um excelente equilíbrio entre não ser condescendente com o leitor (é, afinal, um livro que defende a antifragilidade) e, ao mesmo tempo, não ser intimidante. Se você sente que a jiboia da síndrome metabólica já começou a apertar, esse livro traz muitas dicas valiosas. E mesmo que você já não seja um cacto na floresta tropical, há certos confortos que você nem se dá conta que podem ser ajustados – sem sofrimento.