Dieta e câncer

Há algo no estilo de vida ocidental que favorece um grande número de doenças crônicas. Coletivamente, são conhecidas como Doenças Ocidentais (“Western Diseases”), e incluem a obesidade, a síndrome metabólica, o diabetes, as doenças cardiovasculares e o câncer. O fato destas doenças andarem todas de “mãos dadas” é sugestivo de um conjunto comum de causas. E, de fato, as evidências científicas apontam para um fator comum: a dieta.

Pesquisadores que tiveram a oportunidade de estudar sociedades com estilo de vida tradicional, no início do século passado, tais como Vilhjalmur Stefansson,Weston A. Price e Thomas L. Cleave são todos unânimes em suas observações: o câncer era uma patologia praticamente inexistente nestas tribos (mesmo nos indivíduos que viviam mais de 70 anos), a não ser que os mesmos adotassem o estilo de vida e a alimentação dos colonizadores.

Não vou aqui me deter nos fatores de risco já conhecidos de todos (como cigarro, poluição ambiental, radiação ionizante, produtos químicos carcionogênicos). Vamos identificar a associação entre dieta ocidental e câncer.

Primeiramente, é importante salientar que a obesidade é um fator de risco para muitos tipos diferentes de câncer. Em câncer de próstata, por exemplo, a associação com obesidade é inquestionável.

Assim, por definição, qualquer fator que predisponha à obesidade é uma fator de risco para câncer. Isto significa que o consumo excessivo de carboidratos, especialmente os refinados, aumenta o risco.

Outros estudos indicam que a Síndrome Metabólica está associada ao câncer. Isto significa que mesmo aquelas pessoas que não engordam a despeito de consumirem carboidratos refinados aumentam seu risco de câncer. Mas qual seria a explicação?

Aparentemente, há duas mecanismos principais que levam a um aumento de câncer no contexto da obesidade e/ou síndrome metabólica.

O primeiro é o hiperinsulinismo. Lembre-se de que o consumo frequente de carboidratos leva a um aumento constante de insulina(a fim de evitar o aumento dos níveis de açúcar no sangue). Esta insulina elevada é responsável pelo acúmulo de gordura nas células adiposas e pelo desenvolvimento da síndrome metabólica. Juntamente com a insulina, ocorre a liberação de uma substância chamada IGF-1 (“insulin-like growth factor 1” ou fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1). O IGF-1 está associado ao estímulo da proliferação de vários tipos de células, e ao surgimento de câncer. Isto ajuda a explicar por que os pacientes com síndrome metabólica apresentam tumores mais agressivos, de comportamento mais maligno.

O segundo mecanismo tem a ver com inflamação. A inflamação é um fenômeno normal e necessário, que deve ocorrer agudamente a fim de combater infecções e outras lesões aos tecidos. No entanto, quando a inflamação torna-se crônica e persistente, ela causa uma pletora de problemas (que, coincidentemente ou não, correspondem a boa parte das doenças crônico-degenerativas que assolam as populações de estilo de vida ocidentalizado). Exemplos de inflamação crônica que leva ao câncer são a inflamação dos pulmões pelo cigarro levando ao câncer de pulmão; a inflamação crônica do colo do útero pelo vírus HPV que leva ao câncer de colo uterino; a inflamação crônica do fígado pela hepatite-C levando a câncer de fígado; e a inflamação crônica da pele pelos raios ultra-violetas do sol levando ao câncer de pele.

A síndrome metabólica produz níveis constantes de inflamação crônica no organismo através de diversos mecanismos. Primeiramente, está bem demonstrado que a própria insulina tem um efeito pró-inflamatório. Isto ajuda a explicar por que a proteína-C-reativa, um exame que mede os níveis de inflamação sistêmica, despenca poucas semanas após uma dieta sem carboidratos, antes mesmo que uma perda de peso significativa tenha tempo de ocorrer.

A gordura, especialmente a gordura visceral abdominal, secreta uma grande quantidade de substâncias pró-inflamatórias. Alguns autores consideram que a gordura visceral (abdominal) é um verdadeiro órgão endócrino, secretando constantemente citoquinas e peptídeos geradores de inflamação sistêmica.

Há outros mecanismos, não ligados aos carboidratos, pelos quais a dieta ocidental promove a inflamação. Clique aqui para saber mais.

Agora, de posse destas informações, torna-se fácil entender alguns estudos que têm surgido recentemente. Por exemplo: “Metformina retarda o crescimento do câncer de próstata”. Metformina é uma droga que diminui a resistência à insulina (usada no tratamento do diabetes). Outras pessoas podem não entender o mecanismo, mas você, leitor,  já sabe! Se os níveis de insulina e IGF-1 diminuem, o câncer de próstata crescerá mais devagar (“Metformin reduces insulin, which may promote tumor growth”, afirmam os autores). Agora eu pergunto: para quê a metformina, se basta remover os carboidratos da dieta para reduzir MUITO mais a insulina?

Outro exemplo: “Adiposidade central e câncer de próstata em pacientes negros”. Neste estudo, observou-se que os pacientes com concentração da gordura na região do abdômen apresentava o dobro de incidência de câncer de próstata. Os autores especulam sobre os mecanismos envolvidos, mas você que lê este blog, já sabe! É evidente que a inflamação crônica produzida pela gordura visceral associada ao hiperinsulinismo e ao aumento de IGF-1estão implicados.

Em resumo, reduzir os carboidratos na dieta vai muito além de ficar satisfeito na frente do espelho ou de evitar o diabetes. Ajuda a prevenir um grande número de doenças crônicas e degenerativas, cujo exemplo mais típico são os vários tipos de neoplasias malignas. Se de fato ajuda a prevenir o câncer? Só saberemos quando os ensaios clínicos randomizados forem conduzidos. Até lá, teremos que nos satisfazer “apenas” com perder peso, melhorar o exames e colocar síndrome metabólica e diabetes tipo 2 em remissão.

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